segunda-feira, 13 de maio de 2013

matriz da perda



MATRIZ DA PERDA

E se a noite quebrasse a janela
e entes ardendo em feromônio
rasgassem fendas sono
e nos cobrissem de pó
− cerimônia xamanista
de fertilidade e fusão

E se a tua boca quisesse mais do que som
e a minha à mesma hora também

E se não houvéssemos
arrancado as vinhas
enterrado sob os lajedos
cada vértice do desejo

(pensava sob a hesitante sombra
da árvore de fruta-pão)

Olhava-a agora ausente
ela enterrada na dissidência amarga
no rancor tão tolo

Dizia ao tronco vivo:
o amor nunca prometeu nos salvar
nunca prometeu nada a ela
amor não salva
não precisávamos de razões

Era para ser
violentamente que fosse
não nos tivéssemos enfaixado
com tantas possibilidades conjecturas
medos e imprecisões

: sobe pelas pernas o barro frio
acresce toneladas às sandálias de borracha
arrastadas com esforço
para nunca deixarmos de lamentar
com desgosto
o nosso exílio


(como em “Luto doce”, de Tatiana Morais)


ALBERTO BRESCIANI


Imagem: Lonely eagle de thatryguy2009.deviantart.com

3 comentários:

  1. "Dizia ao tronco vivo:
    o amor nunca prometeu nos salvar
    nunca prometeu nada a ela
    amor não salva
    não precisávamos de razões"

    Simplesmente lindo!

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  2. Adorei a poesia indicada pela Doce Tatiana da àguas

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  3. Sempre poemas lindos. Seleção impecável, como este. Sempre um prazer visitar este blog.

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