I
eu a vi sentada na cadeira de sempre. parecia não dormir há anos. os nós dos dedos estavam brancos de tanto desfiar o terço. ela reza demais. ela chora demais. sempre foi assim. esse pranto de dor. essa reza pedinte. esse fardo maior que a vida. a dela e a minha, desde que nasci.
até quando, minha mãe, esse choro por mim?
II
tenho raiva dela. tenho inveja de sua fé, de seu conformismo, de sua abnegação. sua coragem desmascara a minha fraqueza. eu a culpo e ela disputa comigo uma dor que é só minha. a vida se tornou insuportável ao seu lado.
porque ela sempre soube o que eu nunca hei de saber.
III
ela não me avisou que seria assim, que eu seria assim, feito ela. que ela seria meu espelho. e que sua dor e a minha seriam irmãs. todas as lágrimas que verti têm o gosto dela. tudo é dela.
até esta vocação para a infelicidade.
IV
aquele homem disse: a filha não sobreviverá à mãe. ela acreditou e tem se esforçado em descumprir nosso destino. vez por outra eu a pego tentando desmanchar com os olhos as linhas das minhas mãos.
eu a vi sentada na cadeira de sempre. parecia não dormir há anos. os nós dos dedos estavam brancos de tanto desfiar o terço. ela reza demais. ela chora demais. sempre foi assim. esse pranto de dor. essa reza pedinte. esse fardo maior que a vida. a dela e a minha, desde que nasci.
até quando, minha mãe, esse choro por mim?
II
tenho raiva dela. tenho inveja de sua fé, de seu conformismo, de sua abnegação. sua coragem desmascara a minha fraqueza. eu a culpo e ela disputa comigo uma dor que é só minha. a vida se tornou insuportável ao seu lado.
porque ela sempre soube o que eu nunca hei de saber.
III
ela não me avisou que seria assim, que eu seria assim, feito ela. que ela seria meu espelho. e que sua dor e a minha seriam irmãs. todas as lágrimas que verti têm o gosto dela. tudo é dela.
até esta vocação para a infelicidade.
IV
aquele homem disse: a filha não sobreviverá à mãe. ela acreditou e tem se esforçado em descumprir nosso destino. vez por outra eu a pego tentando desmanchar com os olhos as linhas das minhas mãos.
ela me ama.
e eu a amo tanto, como ninguém, em tempo algum, poderá amar.
mariza lourenço
[imagem de Mihael]
Mais um belo texto da bela Mar!
ResponderExcluirOvelha negra querida...
ResponderExcluirMuito bom.
ResponderExcluirLindo, Mariza!
ResponderExcluire essa vocação para escrever!!
ResponderExcluiraplaudindo aqui!
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